"Esta é a narrativa da vida de todo mundo. Por detrás da enorme diferença, há apenas uma única história, a de se ir do "não " ao "sim ". Toda a vida é: "Não, obrigado. Não, obrigado". E, em última instância é: "Sim, eu me rendo. Sim, eu aceito. Sim, eu compreendo". Essa é a jornada".
Uma experiência forte e significativa de se viver é a sensação de abrir-se e superar um medo. O medo faz com que a gente pare, olhe e se demore, às vezes demais, em algo que deve ser continuado. Lembro-me de uma história em que o mestre se dirige ao discípulo e diz: "Bem, é chegada a hora. Agora você vai passar pela prova do medo. Você entrará neste quarto fechado e haverá uma porta para que você saia do outro lado. Aí dentro, você se defrontará com todos os seus medos. Espero você na saída. Vou te dar só um conselho: aconteça o que acontecer, veja você o que vir e sinta o que sentir não pare. Continue andando... continue andando".
Quando paramos, a situação fica maior. A sombra começa a nos tomar e começamos a pensar toda sorte de bobagens e negatividades e a cabeça começa a fazer uma conversa feia e pesada. Começamos a nos fechar e a nos encolher. O medo faz com que paralisemos e fiquemos agarrados às coisas. Faz com que deixemos passar o timing de sair de uma situação desfavorável, e pode nos fazer perder a dignidade. Não estou propondo a ausência irreal de medo que o expõe ao perigo e risco desnecessários. Estou falando de ter se contaminado demais pelo medo de forma tão sutil que nem mais se percebe a sua presença, mas o seu efeito é, no fim, brutal.
Lembro-me sempre de uma linda cena de um filme do Harry Potter - O prisioneiro de Askaban - que ilustra esse processo muito bem. Harry Potter estava na floresta à noite para salvar alguém e aqueles seres horrorosos das sombras vieram para cima deles e começaram a acuá-los. Harry foi perdendo sua força e os seres foram dominando-o cada vez mais. Ele caiu no chão e as sombras fantasmas ficaram drenando toda a sua energia... Ele estava fraco demais, quase morrendo e tudo parecia já perdido quando aparece uma rena iluminada ao longe e nem mesmo se aproxima, mas com sua luz afasta as sombras que, não aguentando, vão embora correndo. Harry pensa que foi o espírito de seu pai que o salvou.
Essa qualidade de amor que se estende, vai em direção ao outro e diz: "eu vou te proteger", "eu não vou deixar isso acontecer com você!" abre um enorme campo de luz a milhares de quilômetros de distância. Assim é o amor de um ser iluminado. Assim é o amor de um pai por um filho. Assim é a qualidade de vínculo estabelecida entre os seres que sentem o puro e grande amor, que não tem a ver com demonstrações exageradas de amor romântico, mas com estender-se, avançar, e ir em direção ao outro.
A Verdade é o Amor. No fim passamos por tantas experiências e conhecemos demais a sensação de nos encolhermos por medo, e deixarmos passar uma oportunidade de contato (de nos abrirmos) por medo... Vivemos, sendo bem honestos, quase o tempo todo nisso...
Mas ter a experiência de ter dado o passo que se temia, mas se sabia certo, de ter falado quando se fazia necessário, sobretudo ter feito algo por alguém quando era importante que fosse feito, faz-nos sentir uma paz e um orgulho de si para além da arrogância e livre da falsa modéstia. É essa sensação reconfortante e positiva - que vem com saber ter feito o que era certo - que nos garante a satisfação e o preenchimento que nos sustentam, tanto nos momentos difíceis, quanto na hora de partir...
Poder desafiar o medo e não segui-lo é uma experiência daquelas que justificam a vinda ao planeta Terra.
O contrário do Amor não é o ódio. O contrário do Amor é o medo. O medo faz você se fechar e o Amor faz você seguir a despeito de. A despeito de não ser a situação adequada, a despeito de criar talvez mais problemas... No fim das contas, o que vale é ter vivido e ter sido fiel ao bom em você. Isto justifica a vida por se viver e dá paz de espírito na hora da morte. Olhando para trás você terá preferido dar o passo.
Se o relacionamento acabou... No fim, você viveu. Se foi traído, que bom que não foi você!
Se você se deixou ficar numa situação qualquer por medo, se cedeu ao que não devia, ao que não sentia como certo, ou se usou de meios pouco claros para obter o que desejava, reveja, avalie, analise e busque onde estava o medo raiz... O que de fato fez com que você fizesse o que fez? Quais foram as implicações disso para você e para os outros? O medo não é justificativa. O sabor da experiência de sair disso e crescer paga o preço! O resultado é o próprio gesto. Não há ganho. Não há perda.
E, por fim, um detalhe importante: seguindo-se no filme de Harry Potter, descobrimos que a rena era ele mesmo (num desdobramento no tempo) invocando a força e a Luz do Grande Amor e Proteção que combate o medo através da lembrança viva e presente da verdadeira felicidade. No fundo, o que pensávamos vir dos outros (para o bem e para o mal), vem de nós mesmos... E ainda, o que pensávamos estar fazendo aos outros, estamos fazendo é a nós mesmos.
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